quarta-feira, 18 de abril de 2012

Humanismo esperançoso


Gotas de esperança
Aprendendo a cultivar a confiança
Por Marcos Cassiano Dutra


Gotas de esperança no oceano na existência, são pingos de fortaleza que animam o homem em sua sina angustiante como ser em constante construção. Gotas, por que se devem ministrá-las de maneira paulatina, sem exageros, com equilíbrio... Infeliz aquele que se esquece de gotejar a vida de esperança, torna-se um desesperançado e desesperado, caminha sem rumo pelas vielas escuras da consciência atormentada. A esperança clareia a escuridão dos desafios diários de ser gente, palavra-chave para quem quer viver bem consigo e com os demais.
                
 Uma vida humana sem esperança perde seu sentido, é preciso ter no que esperar, caso contrário a vida permanece uma solitária experiência temporal onde nada leva a lugar algum. Olha pois, ó pessoa, para os elementos naturais que apontam para além da concretude do real e aspira pelo depois da finitude! Olha para o coração e enxergue as potencialidades de poder amar e ser amado. Vede o horizonte belo do qual participas no milagre diário de acordar e construir mais um capítulo de sua história! Ah, tenho pena dos enlouquecidos pela correria executiva do mercado financeiro! Alienados na bolsa de valores, stressados pelos rumos da economia de consumo e perdidos no mundo da globalização.
              
Compaixão dos que, mesmo marginalizados, encontram uma razão para sobreviver na sociedade elitista que se esquece de ser irmandade fraterna do bem comum. Esses esperam contra toda desesperança! Abraço com todas as forças o presente e tenho saudade dos momentos bons do passado, assim projeto o futuro, não como um sonho faraônico e utópico, mas como ideal de felicidade, porque a felicidade é um dos efeitos da esperança.
           
 Gotas de esperança no oceano da existência, são oportunidades únicas de levar a frente à vida sem desistir de viver. Aos deprimidos de hoje eu rogo esperança na problemática árdua de amadurecer os frutos dos sentimentos, a fim de que não percam seu sabor de humanismo. Inclino minha cabeça em reverência ao pôr-do-sol anunciando o declínio natural do humano, e, exclamo com voz forte e orante: vale a pena viver e deixar-se modelar pelas surpresas do cotidiano!
            
 Gotas de esperança no oceano da existência são assim: pequenas, todavia de grande valor. Pingos sem pressa e alarde, pingos que induzem a confiança, pois sem confiança não há esperança!
 

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Transcender a sexualidade

Moral, sexo e religião
A relação entre religiosidade e sexualidade humana
Por Marcos Cassiano Dutra


Sexo, palavra curta, mas muito tocante a todos os seres humanos, pois significa algo que vai da intimidade de uma pessoa para com a outra, numa atitude que chamamos de amor Eros. Sexualidade, outra palavra correlacionada, porém mais abrangente. Não se reduz propriamente ao genital e sim a toda corporalidade do homem enquanto ser vivo, dotado de capacidade afetiva no relacionar-se com os demais na vida, quer social, familiar e religiosa. Sexo e sexualidade são dois assuntos que tocam profundamente a realidade religiosa. A religião é formada visivelmente por pessoas, homens e mulheres, que são assexuados, que carregam consigo o potencial humano do sexo. Cada religião possui uma reflexão de fé acerca do ato sexual e da manifestação da sexualidade humana. Dá-se o nome dessa reflexão de teologia moral, dado que sexo e sexualidade são por índole atos e atitudes de cunho moral, ou seja, da consciência humana e de um convívio social pautado em bons valores culturais, transmitidos ao longo do tempo, pela família, comunidade, instituição ou grupo religioso.  
             
As reflexões da crença sobre o sexo e sexualidade humana são várias e específicas, entretanto todas apontam para algo maior que transcende a simples aparência assexuada do ser humano: o Transcendente. As crenças religiosas, especialmente o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo, entre outras manifestações religiosas ocidentais e orientais, admitem ser o sexo uma qualidade natural e ao mesmo tempo sobrenatural do homem, pois o humano é parte integrante do mistério da vida e o sexo e a sexualidade são em si os sinais sensíveis desse mistério existencial que circunda, envolve e acompanha a vida humana desde sua concepção até o desfecho final do existir temporal, a morte. Ninguém tira de si a sexualidade e os desejos sexuais. A sexualidade e os desejos eróticos são parte do eu humano, é o meu ser, é também a minha identidade enquanto ser vivo racional e a oportunidade natural de prosseguir a minha existência em outro, que se tornará em potência uma vida humana corporal apartir da união sexuada entre os gêneros feminino e masculino. É um aspecto físico da realização natural e pessoal do ser no exercício de seu gênero, seja ele masculino ou feminino ao procriar-se ou relacionar-se. Por isso a crença é unânime ao reconhecer a importância da família, como núcleo elementar do desenvolvimento saudável da sexualidade do ser humano.
            
 Mesmo sendo encarado pela reflexão religiosa como um dom divino, o sexo e a sexualidade, em certa medida, ao longo do tempo, foram ignorados pela esfera da religião. O caráter sexual do homem ficou em segundo plano. Seu eu humano voltava-se exclusivamente para a realidade transcendental da alma em desprezo da realidade transcendental do corpo e de sua sensibilidade sexual, visto por algumas práticas religiosas como um “estorvo demoníaco” no caminho da acese espiritual. Coitado do corpo! Era, pois judiado por silícios e chicotes, frutos de uma mentalidade mergulhada na dicotomia platônica entre corpo e alma, que influenciou grandes pensadores da teologia no período teocêntrico, com relação à noção de pecado original e do corpo como cárcere da alma. A figura da mulher, do feminino, era por vezes comparada ao diabo, a tentação, ao mau caminho. E assim, sexo e sexualidade se reduziram a meras “sombras tentadoras da existência humana”, por isso eram ignorados e torturados pelos autoflagelos. Tal contexto idelógico-religioso permaneceu influente durante a época do teocentrismo medieval.
             
Com o passar dos séculos, a maturidade da religião, paulatinamente abriu-se novamente à discussão em torno do sexo e da sexualidade dentro da prática da fé. Sexo e sexualidade são agora novamente considerados dons de Deus, algo sacro que está presente na vida humana em vista da procriação. Por isso a moralidade religiosa hoje fala da sacralidade do corpo, do sexo e da sexualidade. Recuperou-se o discurso pastoral sobre o sexo, todavia o moralismo religioso de algumas correntes ideológico-religiosas ainda perdura e deturpa a real visão teológica sobre essa questão moral e natural de todo homem e mulher, religioso e não religioso, leigo ou clérigo. Há também o erotismo militante da sociedade contemporânea que fomenta idéias caricaturadas do caráter sexual humano, que em nome da falaciosa “igualdade sexual”, alça mão de artimanhas para difundir idéias relativistas acerca do sexo e das opções sexuais a fim de minar as estruturas sociais que salvaguardam a moralidade humana.  
           
 De outro lado, o preconceito religioso (puritanismo) acerca do sexo e das manifestações da sexualidade, que não é somente dos cristãos, mas outros modelos religiosos o tem lamentavelmente, em nome de “Deus” e da fé, legitimam atos de total repressão da sexualidade humana e de consolidação do machismo no ambiente social. O desafio contemporâneo é, pois como dialogar sobre sexo dentro e fora da comunidade de fé diante das manifestações da sexualidade humana presentes na sociedade, sem partir para a ignorância ou para o relaxismo moral, todavia abertos ao respeito e a acolhida de todos e todas como pessoas humanas em sua dignidade. O hedonismo é um fenômeno hodierno, na mesma medida em que as fobias sexuais religiosas o são também. Redescobrir a beleza humano-divina de ser assexuado, a essência do sexo como parte importante da intimidade do homem e a sexualidade como expressão afetiva da corporalidade integrada e saudável, é a chave de leitura para o desdobrar da reflexão religiosa e social da relação entre religiosidade e sexualidade humana.
            
 Questões como a “guerra de sexos” entre homens e mulheres na sociedade, o papel da mulher na esfera do mundo e da crença, a humanização do trato respeitoso para com as pessoas de opção homossexual, são os paradigmas que indagam a capacidade dialogal entre a moralidade religiosa e as problemáticas do mundo contemporâneo. O Século XXI anseia por uma religiosidade bem relacionada com o caráter sexual do ser humano. Fé e vida não se contrapõem, se assertivamente integradas. A fé (fala religiosa) ajuda e contribui para uma vida sexual saudável quando apresenta a sexualidade como dom divinal a ser zelado e a vida, ajuda a fala religiosa a não se tornar arcaica e moralista neste quesito, dando a ela a oportunidade de aprofundar-se bem nessas questões da intimidade do homem.
            
 Uma sexualidade bem vivida e uma vida sexual saudável e digna é tesouro existencial que aponta para uma valorização assertiva do gênero humano, sem reduzi-lo como mero produto do mercado sexual. Cada pessoa, especialmente cada cristão, é chamado a amadurecer sua sexualidade para viver bem consigo e com os outros, no exercício da vida social e da própria vocação específica a qual fora chamado.
           
 Moral, sexo e religião são assuntos de ontem, hoje e sempre, porque em todos os momentos da história o homem necessita de algo que lhe forme sua consciência nesses assuntos, visto que ele é um ser em constante construção. Que a religiosidade, seja ela cristã ou não, ajude a humanidade a formar bem sua consciência moral e sexual ao invés de deformá-la sobre pretextos de puritanismos repressores dessa parte bela da vida humana: a sexualidade, a corporalidade... Sinais corporais da beleza do Criador, que tornou o homem um continuador natural do milagre da vida e capaz de relacionar-se intimamente com aqueles que ama, demonstrando afeto, amor e desejo.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Celebrando a Páscoa de Cristo


A vida cristã na Páscoa de Cristo
Vivenciando o tempo pascal
Por Marcos Cassiano Dutra


Com a celebração do tríduo pascal, a Igreja inicia o tempo litúrgico da páscoa. A presença do Ressuscitado, simbolizado no círio aceso durante as celebrações, é sinal simbólico de sua vitória triunfal frente ao pecado e a morte. Branca é a cor da liturgia nesse período solene, significa o caráter festivo que envolve a comunidade de fé, a qual caminhou penitente durante a quaresma para vislumbrar, na esperança, a escatologia final de todos apartir da redenção e salvação em Cristo, crucificado-ressuscitado.
            
 Os discípulos de outrora, reconheceram o Senhor ressurgido por meio da fração do pão e de suas chagas gloriosas. Os cristãos de hoje, reconhecem e crêem no Ressuscitado por meio da fé da Igreja, no testemunho apostólico dos que fizeram a experiência discipular e pascal com Jesus Cristo e a transmitiram, ao longo dos séculos, ensinando e celebrando.
             
A ressurreição é um mistério de fé que transcende o limite natural da existência: a morte. Obra inefável e teofânica de algo maior a envolver a crença nessa verdade de fé cristã, na veracidade do acontecimento da Ressurreição do Senhor e sua influência salvadora na vida de todos os seres humanos.
            
 O filósofo moderno Martin Heidegger, em seu estudo acerca da metafísica do ser, afirma que, “a essência da presença é a existência”. Relacionando o conceito filosófico-metafísico com a cristologia da ressurreição, pode-se dizer que o mistério pascal do Senhor é a essência de sua sagrada presença. Apartir de sua misteriosa existência como Verbo Divino humanizado (encarnado) e ressurgido (ressuscitado) Jesus dá novo sentido à vida humana, visto que a ressurreição é por índole uma realidade fideístico-metafísica, pois vai além do natural humano: a finitude temporal (a morte). Diz Santo Agostinho – “A vida mortal é a esperança da vida imortal”, logo em Cristo, primícia dos que morreram, concretiza-se plenamente essa máxima da esperança cristã, esperança final que penetra pela fé toda a essência do ser humano enquanto um ser que aspira pelo transcendente, pelo algo mais do depois da natureza palpável - o sobrenatural. O Ressuscitado é, portanto, esse sobrenatural, que rompe com o elo mortal que cessa a existência, dando a ela uma nova realidade, uma realidade mística e infinita em Deus. 
            
 A paixão, morte e ressurreição de nosso Senhor é a mais eloquente, mesmo que misteriosa por sempre, explicação do sobrenatural que compreende a divindade do Filho de Deus, que se revela existencialmente como Jesus de Nazaré (Jesus histórico) e de forma sobrenatural como o Cristo da fé numa unidade inquebrantável. O mistério da ressurreição não é um fato isolado na história da humanidade de Jesus, é referência existencial da esperança final (escatológica) de todo ser humano no Ressuscitado: a vida eterna, e nela todo aspecto salvífico e redentor que contém e é dado ao próprio homem participar de tal tesouro de fé, por ser ele (o homem) o destinatário direto da graça que advém da ressurreição do Senhor. Pois a vitória de Cristo Ressuscitado é a vitória de todo cristão! Em suma, rezamos com São Paulo Apóstolo: “Se com Cristo morrermos, com Ele ressuscitaremos”.