sexta-feira, 23 de março de 2012

A mística da fé cristã


Contemplando o mistério
Aprendendo a meditar a fé cristã
Por Marcos Cassiano Dutra


Diante do mistério de Deus só nos cabe uma única atitude: contemplá-lo. Sim, porque somente pela contemplação estaremos em sintonia com a santa vontade do Senhor. A atitude contemplativa da Virgem Maria deve ser a de todo cristão. Ela meditava e guardava tudo em seu coração orante. O coração do cristão é um recipiente singelo onde a graça de Deus quer estar presente. A graça de Deus é o próprio Verbo Divino humanizado, Jesus Cristo, o Mestre de Nazaré. Quando reza-se a jaculatória do Sagrado Coração, piedosamente clamamos ao Senhor para que nosso coração torne-se semelhante ao dele, todo puro, todo misericórdia, todo bondade, todo redenção, todo servidor... Infeliz quem ainda não entendeu a primazia da contemplação na vida humana, acima de todas as demais preocupações temporais do ser gente no mundo. A contemplação não é somente privilégio da vida religiosa monástica, é uma característica do ser cristão. Contemplar é adorar, é colocar-se frente ao Transcendente com o intuito de mergulhar toda a existência no grande oceano do inefável, do teofânico, do revelado.
             
A cena contemplativa mais bela da Sagrada Escritura é com certeza o episódio da crucificação, quando Maria e João, o discípulo amado, em pé, fixam seus olhares em Jesus crucificado. Não há palavras, mas a troca de olhares, qual um casal apaixonado que se olha em atitude de amor e carinho. Maria, João e Jesus, se olham em atitude profunda de amor. Deus apaixonado pela humanidade, que se deixa morrer para salvá-la e a humanidade, em Maria e João, que recebem extasiados a graça da salvação. Cristo ao ressuscitar não deixa de lado os sinais de seu suplício glorioso, não! Pelo contrário, Ele assume as santas chagas como sinais de seu amor infinito pelos homens. Por isso apresenta-se ressuscitado com chagas, e seus discípulos o reconhecem não só pelo partir o pão, mas pelas chagas da cruficação. Tomé se atreve a tocá-las e faz sua profissão de fé – “Meu Senhor e meu Deus!”. Contemplar o mistério de Deus é também tocá-lo, ou seja, senti-lo próximo de nós. Cristo é esse mistério divinal que tocou pela encarnação, o solo da humanidade. Deus também quis tocar-nos em seu Filho hominizado na nossa história. A contemplação é uma relação tocante entre o divino e o humano.
             
Vários são os santos e santas místicos ao longo da história da Igreja, neles temos uma referência existencial das mais distintas formas de contemplação. Sobretudo aprendemos que para contemplar o mistério é antes de tudo necessário reconhecer-se pecador e necessitado do perdão misericordioso de Deus. O homem e a mulher contemplativos são pessoas de conversão diária, de constante exame de consciência, de uma vida penitencial, revestida de uma santidade que os torna virtuosos no exercício de suas vocações e da própria humanidade, isto é, a contemplação nos torna maduros na fé e na vida.
             
Dom Augustin Guillerand, Bispo Francês, assim escreve em seu diário espiritual - “O mistério não é sombra negra ante a qual os olhos se devam fechar e calar : ao contrário, é claridade deslumbrante, da qual precisamos embeber o olhar, reconhecendo que ela o transcende.” O secularismo por vezes enxerga o mistério da fé como sombra de uma caverna, porém o mistério é luz ao fim do túnel angustiante da existência  que cultiva a esperança cristã, mesmo diante dos desafios e sofrimentos que a vida apresenta ao longo dos anos. Além do túnel está a certeza da aurora celestial.    
             
Uma fé cristã não contemplativa é um equívoco teológico. Um dos frutos da fé é a contemplação. Contempla a fé cristã quem faz de sua vida uma liturgia cotidiana, em constante preparação e sintonia com a liturgia celeste da Santíssima Trindade. Sócrates contemplava o mundo das idéias universais, nós, cristãos, contemplamos Deus, realidade universal que está presente na vida humana, qual idéia criativa a continuar sua história da salvação nos dias de hoje em cada um de nós.
 

Preparando para o tríduo pascal


A paixão de Cristo
Rezando a páscoa do Senhor
Por Marcos Cassiano Dutra


Oh Cristo pendente na Santa Cruz! Sinal eloquente da redenção!
Beijo tuas chagas gloriosas e me ajoelho diante de vosso madeiro.
Estás ensangüentado e desfalecido, mas exala o suave odor da santidade
Que perfuma de esperança a vida de todos quantos fixam o olhar em vós.

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Senhor Jesus crucificado, olhai e vede todos que atraístes a sombra de sua cruz.
São homens e mulheres de todos os quadrantes da terra.
Todos hão de lavar e alvejar suas vidas em vosso Sacratíssimo Sangue redentor,
Eles são seus santos e santas a rodearem-no em sua paixão
Como prelúdio teofânico da graça abundante que brota de seu coração transpassado.

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Oh Cristo pendente na Santa Cruz! Sinal eloquente da redenção!
Lembrai-vos de todos os desesperançados quando entrardes no teu reino.
Levai todas as almas para o seu e concedei o alívio aos agonizantes do corpo e da alma.
Sede o doce remédio celestial para os aflitos e esquecidos.

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Senhor Jesus crucificado, olhai e vede todos que atraístes a sombra de sua cruz.
São os cristãos de sua Igreja, o povo de Deus.
Homens e mulheres de boa vontade a percorrerem o mundo sendo sal e luz. 
Acompanhai-os em seus esforços por uma sociedade humana e cristã.

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Oh Cristo pendente na Santa Cruz! Sinal eloquente da redenção!
Pedimos pela santificação do clero.
Seus sacerdotes necessitam santificarem suas vidas em vós.
Sede a força sacerdotal, a riqueza sacramental, a inundar de amor a vida clerical.
Em vossa Pessoa Sagrada, consagramos todos os sacerdotes de ontem e hoje.

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Oh Cristo pendente na Santa Cruz! Fazes dela vosso trono glorioso.
Majestade divina que se deixa morrer para salvar o gênero humano.
Somente vós, Cordeiro de Deus, fostes capaz de se entregar e de resgatar para todo o sempre a criatura humana ao fazer-se crucificado e ressuscitado.
Bendito sejas, Bom Jesus, em sua Paixão!
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 No calvário convosco, percorremos extasiados a via sacra.
Contemplamos vossas estações e vos bendizemos, Ó Senhor,
Porque pela vossa Santa Cruz, remistes o mundo. Amém.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Filosofia da existência

Questionando a existência
A vida filosofal
Por Marcos Cassiano Dutra


Porque o ser humano anseia pelo transcendente e angustia-se paulatinamente nessa sina existencial conflituosa consigo mesmo? O questionamento feito nada mais é que a expressão do próprio eu humano em constante indagação com sua consciência. Os chavões filosóficos – Quem sou eu? De onde vim? Para onde vou? São os protótipos vivenciais da humanidade desde sua gênese, passando pela época clássica grega, o medievalismo, a modernidade e culminando hodiernamente na crise de identidade da contemporaneidade. Se outrora a preocupação filosófica era o ser, visto apartir da physis (natureza), posteriormente o Deus cristão em sua misteriosa revelação e depois o conhecimento, seja ele empírico ou racional, hoje, qual é a preocupação filosófico-existencial? São as questões de gênero? A economia e seus efeitos galopantes na sociedade de consumo? Há uma célula filosófica comum ou a humanidade trilha um caminho tortuoso em direção da caverna secular do capital?
           
Segundo Marx, “não é a consciência do homem que determina seu ser social, mas seu ser social quem determina sua consciência”. A máxima marxista tem alguma razão histórica ou é efêmera ao cotidiano atual? Que se entende por consciência do homem e seu ser social? Cabem ainda outras perguntas – O que pensa o homem contemporâneo acerca de sua vida? Fico a pensar, onde está o idealismo que movimenta os desejos humanos? Ter ideal é ter um sentido de vida, viver por uma causa a que dedicar à vida. Porque vivemos?
           
Prefiro acreditar no devir de Heráclito, no sentido de que as mudanças e os opostos que se atraem, sejam fenômenos essenciais para a interação entre a vida e a realidade, apartir das quais tudo flui e se consolida no tempo, na história, como algo concreto do abstrato dos universais que se fazem presente na consciência do homem (mundo das idéias), ao mesmo tempo imanente e transcendente, contemplativo e prático.
           
Heidegger, filósofo moderno, vai dizer que a morte é o problema interior da existência, problemática temporal e não espacial. Se o problema é a morte do ser que se humanizou, porque temê-la? A morte nada mais é que o findar da vivência, o desfecho derradeiro do ser gente. Enquanto a política internacional centra a atenção em assuntos econômicos e bélicos, a humanidade sofre a carência de ideais, de sabedorias filosóficas que a ajudem a percorrer a vida finita sem perder o gosto de viver. Redescobrir o prazer de ser vivo é a condição existencial para tentar chegar a respostas plausíveis aos questionamentos que circundam o homem hodierno. Nesse aspecto, Epicuro é uma referência tanto filosófica como existencial.
           
“Conhece-te a ti mesmo”, clama Sócrates em sua maiêutica e ironia. De fato, a humanidade atual precisa se conhecer, se conhecer capaz de filosofar sobre si mesma, sobre sua antropologia, sobre seu humanismo, sobre seu protagonismo no mundo, antroposfera na qual cada um se descobre humano e assim cria relações sociais por meio das quais se integram e fazem surgir uma sociedade, a qual necessita de sujeitos pensantes, pois o homem é racional e político naturalmente, mas também é alienado e omisso, ou seja, paradigmático: construtor ou destruidor de si, Thomas Hobbes classificaria como uma alcatéia de homens-lobo procurando se devorarem.
           
Não cabe o desespero, mas a coragem de uma práxis que comece pelas estruturas interiores do ser humano para assim transformar as estruturas exteriores da humanidade, do contrário tudo mais é mera demagogia enrustida de falaciosa conscientização pelos tutores da consciência, os quais, segundo Kant, impedem a maioridade do ser humano.

sábado, 17 de março de 2012

Poetizando a existência...

A vida em poesia
Aprendendo a ser o poeta de si mesmo
Por Marcos Cassiano Dutra


Dizem que um poeta é um eterno sofredor, que busca amenizar suas dores nos versos que inteligentemente ele escreve. Na sinfonia das palavras, que vão aos poucos formando a poesia, brinca o escritor com seus sentimentos, externizando e eternizando o mais íntimo de sua alma. Alma sábia de quem entende ser a vida uma oportunidade única de exercitar a completude da existência humana, por isso escreve, porque sua intuição literária aponta para algo maior que o motiva a redigir versos poéticos. Que algo é esse a motivar o poeta? É o amor, um amor tão grande pela arte de transmitir belas mensagens por meio da articulação entre as letras do alfabeto.
Quero ser hoje esse poeta. Quero externizar o mais íntimo de minh’alma, a fim de deixar marcado para sempre aquilo que sinto. Um sentimento reprimido frustra e é um atentado contra a própria humanidade da pessoa. Ninguém se humaniza reprimindo-se, mas assumindo seus limites, ideais, sentimentos...Seja eu um poeta corajoso, capaz de não temer o juízo dos que de maneira equivocada se intitulam donos da moral e das verdades naturais e sobrenaturais. Voa a liberdade diante da trama das estruturas que deprimem o ser humano com suas teorias desumanas. Alcança a alma inquieta seu mais terno objetivo de chegar ao horizonte daquilo que não se sabe o que é - o mistério do além; quem sabe lá ela encontre seu repouso e sua paz.
Angustia? Porque angustiar-se? A vida é muito mais que uma realidade de decepções e desilusões. Basta romper a crosta do fracasso e aprender a bem viver apartir das experiências, fazendo da vida uma poesia, mesmo que trágica, seja ela uma epopéia com direito a heróis míticos que descem do divino para salvaguardar o personagem principal da história, num enredo de luz e sombras, mas que no final torna-se vitória triunfante.
Parte para longe, não para fugir do futuro e sim para repensar os projetos e amadurecer a consciência. A distância é o sábio remédio da maturidade, ela transforma a mentalidade, ela purifica os exageros, ela ensina a dar valor ao que merece ser valorizado. Sou o poeta da confusão, o “confucionismo” de meus versos tem uma razão: fomentar em quem lê outra perspectiva de olhar o contexto do texto, ir mais adiante da regra, afinal a poesia é um gênero livre, sou livre para escrever e você é livre para interpretar. A liberdade é uma qualidade natural a ser preservada, ultimamente está em extinção. Chega de mentes alienadas e esmagadas. Quem me lê é convidado a tornar-se poeta de si mesmo, procurando tornar concreto seu eu interior nas palavras escritas no papel do cotidiano, com a tinta da sinceridade e da expressividade pessoal.
Não me pergunte porque escrevi tudo isso, não há resposta plausível a não ser a inspiração que ronda a mente do poeta em dias de contemplação. Assim como o cantor musicaliza suas angustias, poetize suas angustias também. Uma vida musicalizada e poetizada está longe de ser desequilibrada e perdida no tempo, antes se torna obra-prima de quem a fez, uma obra de arte de incalculável valor histórico. Dizem que um poeta é um eterno idealista. Um poeta sem ideal não existe, uma vida sem ideal deixa de existir. Vida poética idealizada é um projeto que supera as expectativas. Poetizar nada mais é que saber viver. E nós sabemos viver?
Sempre há uma oportunidade de iniciar a terapia da poesia existencial no dia a dia. Se o século tem algum mal, esse mal é o comodismo, senhor da descriatividade e do auto-assassinato da capacidade artística do homem. Cabe o esforço de deixar-se inspirar e começar a escrever os primeiros versos da vida que se abre para o outro lado do ser pessoa: a criatividade. Se a vida é um dom, quero tê-lo. Se a vida é um tesouro, quero conquistá-lo. Se a vida é um mistério, quero entendê-lo. Se a vida é o bem, quero praticá-lo. Enfim, se a vida é uma arte, quero ser o seu artista e fazer o mundo mais admirável e belo com minha criatividade!