sábado, 27 de abril de 2013

Redescobrir Cristo nos marginalizados


O Cristianismo e os excluídos
A finalidade da caridade cristã
Por Marcos Cassiano Dutra

“Mais que comum dos dias, olhei o mais que pude os rostos dos pobres, gastos pela fome, esmagados pelas humilhações, e neles descobri teu rosto, Cristo Ressuscitado!”
Dom Hélder Câmara

            Sempre o tema dos excluídos causa polêmica no interior dos debates religiosos, seja entre os que ignoram a questão da exclusão social e da marginalidade no discurso de fé ou por parte daqueles que supervalorizam um ativismo social em menosprezo da espiritualidade, como força de fé que motiva a caridade e a fraternidade cristã. 
            Se olharmos para a história da vida de Jesus Cristo, narrada pelos textos sagrados da Bíblia, veremos que sua ação messiânica era de total predileção pastoral aos excluídos e marginalizados de seu tempo, aos quais defendia a dignidade e convidava à conversão e eram por Ele considerados os destinatários privilegiados do Evangelho. Tal opção jesuânica preferencial pelos esquecidos do mundo é atestada em um dos evangelhos (Cf. Mt 25, 31-46), quando Ele mesmo diz: Eu tive fome, sede, estive enfermo, perseguido, preso, nu e pedi auxílio. Cristo identificou-se totalmente com os explorados, injustiçados e empobrescidos, e hoje, seus seguidores, os cristãos, são capazes de viver essa virtuosa identificação evangélica com os mais carentes?
           O alcance das palavras de Jesus é perene, por que Nele o mistério de Deus habita em Pessoa e Obra. Mistério, cuja natureza divina é infinita. Portanto, em que sentido as palavras, os gestos e a ações do Bom Samaritano da humanidade (Jesus) continuam a questionar e fomentar, em quem Nele acredita e confia, sinceras atitudes de amor, compaixão e compromisso com o próximo excluído e ignorado da sociedade contemporânea?
          A dimensão da espiritualidade é necessária ao agir cristão, na mesma intensidade que a relação entre fé e razão, ou seja, fé e vida caminham juntas! Não se edifica o edifício evangélico da caridade sem uma fundante experiência de fé com Jesus de Nazaré, sem fé a caridade cristã perde seu sentido e torna-se mais uma ideologia no tempo e na história. Somente com a fé é possível fazer o encontro pessoal e comunitário com Jesus Cristo vivo e presente nas pessoas perseguidas e marginalizadas. É a fé sincera e comprometida que nos torna capaz de enxergar, na fisionomia dos marginalizados e injustiçados, o rosto pascal do crucificado-ressuscitado. Quem o descobre, nesse segredo de fé, entende a essência da vida cristã e vive em santidade a prática da caridade e da justiça, haja vista os exemplos de tantos como Madre Tereza de Calcutá, Irmã Dulce, Dom Hélder Câmara, Francisco de Assis, Dom Bosco, entre tantos outros homens e mulheres de fé e caridade transformadora.
       O trecho da Gaudium et Spes - Constituição Pastoral do Vaticano II – já aponta a diretriz da caridade transformadora ao exortar:  “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente humana que não encontre eco no seu coração.” Essa é a finalidade da união íntima da Igreja com a família humana, a caridade que dialoga e busca caminhos para promoção da dignidade dos filhos de Deus.
       O tema Cristianismo e os excluídos jamais deve sair do cenário das discussões religiosas, por que é imprescindível essa reflexão e ação. Um Cristianismo surdo e cego frente à exclusão social de milhões de pessoas, vítimas de um sistema político, social moral e religioso demagógico, é tudo, menos comunidade de fé dos discípulos de Jesus Cristo. Isso o próprio Papa Francisco deixou bem claro na primeira missa após sua eleição – Cristianismo que não vive a essência da caridade cristã, que é Jesus Cristo, é apenas uma piedosa ONG, mas não Igreja de Jesus Cristo. 
 

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Filosofia e humanidade


As mudanças do ser humano
Uma análise sobre Heráclito e Hegel
Por Marcos Cassiano Dutra


“Não podemos entrar duas vezes no mesmo rio, pois suas águas se renovam a cada instante. Não tocamos duas vezes o mesmo ser, pois este modifica continuamente sua condição” – Há muito tempo atrás, na história da filosofia antiga, um dos filósofos pré-socráticos disse isso, seu nome era Heráclito.


Não banhar-se duas vezes no mesmo rio significa que a vida humana é como uma correnteza, tal qual a água no rio sempre em movimento (mudança). A essa mutação Heráclito chamou de devir, ou seja, vir a ser. Em Heráclito o homem é um vir a ser diário. Não é um ser estático no tempo e na história, mas uma peça essencial na engrenagem da realidade (passado, presente e futuro).

Entretanto a teoria dele não teve a mesma influência nos gregos antigos como a teoria de Parmênides, no sentido de que a realidade é imutável, estática e permanente, e o ser é e não pode não ser, ao contrário de Heráclito o qual afirmava que tudo se move e por isso se transforma.

Posterior a Heráclito, outro filósofo, na contemporaneidade, utilizou da máxima do devir heraclitiano para constituir sua teoria sobre a dialética da história. Esse filósofo é Hegel. Ele faz crítica à concepção antiga dos gregos firmada no pensamento de Parmênides, que considerava como já foi dito, a realidade algo estático e o ser definido. Para Hegel há uma contradição nessa afirmação, tudo é uma formação contínua, um permanente processo de modificação que evolui constantemente.

Logo, o homem não se limita a ser ou não ser, ele é um eterno vir a ser, um movimento contínuo de opostos, que ao oporem-se formam aquilo que Hegel chama de dialética. Em outras palavras, o ser é igual a si mesmo e igual ao seu contrário, quer dizer, o ser é a contraposição de si mesmo. Essa é a base da concepção dialética da realidade em Hegel, no sentido de que o real não é aquilo já existente desde toda a eternidade, mas sim um processo transformador da contradição. A realidade é uma ação mutante que gera transformação existencial e temporal.

É mérito de Hegel a inserção da racionalidade em um processo ao mesmo tempo real e complexo a partir da transformação dos contrários, por meio da luta deles entre si e do princípio da contradição e não da identidade. Ele é o responsável por sistematizar uma tríade composta de três etapas que formam a dialética:

• Tese: Corresponde a afirmação, que implica na identidade do ser, a qual se relaciona com a infância do ser racional.

• Antítese: Corresponde à negação, que implica no questionamento do ser sobre si mesmo (sua identidade), a qual se relaciona com a adolescência do ser racional.

• Síntese: Corresponde à conclusão, oriunda do discernimento entre identidade e questionamento. Relaciona-se com a maturidade do ser racional.

Se Heráclito na antiguidade lançou as bases da mutabilidade da realidade, Hegel na contemporaneidade identificou essa mutação como sendo dialética. Portanto, ao ler-se tanto um e outro há alguma possibilidade de lançar conceitos novos embasados das teorias de ambos os filósofos? Por que ainda hoje a filosofia heraclitiana e hegeliana é estudada? Ela ainda é capaz de explicar o ser e a história ou não? Que se entende sobre historicidade na pós-modernidade?

Reforma da Cúria Romana


O DESAFIO DO PAPA FRANCISCO
Por Marcos Cassiano Dutra


“A Igreja que, certamente precisa de recursos humanos, não foi fundada para buscar glórias terrenas, mas para pregar, também com seu exemplo, a humildade e a abnegação”

Lumen Gentium.


O principal desafio do pontificado de Francisco no momento é a almejada reforma da cúria romana. Para isso o Papa constituiu um conselho de consultores formado por oito cardeais, representando os cinco continentes, a fim de auxiliá-lo nos trabalhos reformatórios curiais, a partir de uma minuciosa análise e revisão da Constituição Apostólica promulgada por João Paulo II em 1988, a qual regula a composição e as competências dos vários organismos que formam a cúria.


Essa iniciativa se deve aos últimos acontecimentos passados que culminaram na publicação de informações e na denúncia de problemas internos durante a gestão de Bento XVI, o qual fora surpreendido por tal ocorrência, que com certeza o decepcionou muito no final de seu pontificado.


Sem dúvida alguma é a decisão mais importante tomada pelo Santo Padre Francisco desde que ele foi eleito e assumiu o trono de São Pedro em março desse ano. Resta agora aguardar a tramitação dos trabalhos do conselho de consultores para enfim poder enxergar suas conclusões e medidas pertinentes.


A Igreja Católica Apostólica Romana é uma instituição religiosa de grande importância para a história da humanidade no Ocidente não só no quesito religioso como cultural também, por isso as decisões de um pontífice surtem efeito na sociedade ocidental e não somente nos fiéis, bem como notícias com relação à Santa Sé ocupam as manchetes dos informativos jornalísticos radiofônicos, impressos, visuais e virtuais.


Oportuno é recordar o Capítulo I da Constituição Dogmática Lumen Gentium que afirma: “a estrutura social da Igreja serve ao Espírito de Cristo”, ou seja, ela é ao mesmo tempo visível e espiritual, humana e divina, poder e carisma, todavia o seu poder está a serviço do carisma fundante que é em si a Pessoa de Jesus Cristo, fundador e fundamento.


Portanto, condutas incompatíveis com o ser e agir de Cristo, que é a referência de vida cristã, é além de pecado grave contra a santidade da Igreja, atitude não ética que merece a devida punição eclesiástica e civil. Clérigos e laicos envolvidos no escândalo Vatileaks, o qual abalou a credibilidade da Igreja diante dos cristãos e da sociedade mundial, necessitam de devida punição. Além de reformar o gerenciamento da cúria romana, a penalização dos culpados é de suma importância para que episódios lamentáveis como o do vazamento de informações internas, bem como a delação de corrupção econômica e moral dentro da sé vaticana não tornem a ocorrer.


Fatos como o Vatileaks não podem ser deixados em branco, afinal o que está em jogo não é um fato isolado, mas sim a transparência com que se leva a cabo tal assunto. Ainda na Lumen Gentium, o Capítulo VII sobre a escatologia da Igreja ressalta: “No fim dos tempos seremos, cada um, remunerados pelas obras da vida corporal, consoante houver praticado o bem ou o mal”. Oxalá o Senhor encontre sua Igreja perseverante no Evangelho e livre do materialismo e da imoralidade, que maculam seu caráter de ser Sacramento de Salvação na humanidade.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Espiritualidade do silêncio

Deus fala quando a gente se cala

Por Marcos Cassiano Dutra


Querido Dom Hélder Câmara, a quem eu tenho profunda admiração e devoção por sua vida e virtudes, ensina-me a ser mensageiro de paz no silêncio que fala mais que mil palavras e no olhar sereno que tudo confia à Divina Misericórdia.


Como tu, também eu rezo essa singela e tocante prece, nos instantes que seguem o final dessa postagem: "Senhor Jesus, não te apagues tanto dentro de mim! Fala por meus atos, anda por meus pés, ama por meu coração, ouve por meus ouvidos, fala por minha boca, olha por meus olhos, respira por meu nariz, gesticula por minhas mãos... Que a minha pobre presença humana lembre, ao menos de longe, a tua Divina Presença. Amém"


Sábio é Padre Roque Schneider, SJ que diz - "Deus fala quando a gente se cala". No silêncio que grita ao sagrado, o mistério vem falar a nós. Obrigado Senhor por silenciar-me.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Papa Francisco: As perspectivas de um pontificado.


O Papa e a reforma do Catolicismo
Qual é o verdadeiro reformismo de Francisco?

Com a eleição do Cardeal Argentino Jorge Mario Bergoglio para ser o novo Sucessor de São Pedro, a Igreja Católica Apostólica Romana inicia uma nova fase em sua história milenar, afinal cada pontífice é o responsável visível na guia da comunidade de fé dos discípulos de Jesus, fundador e fundamento do Cristianismo, do qual o Papa é seu Vigário na terra.
            
O clima eufórico dos fiéis e dos não-crentes e não-cristãos com relação ao novo Papa que assumiu o nome de Francisco para seu pontificado causa esperança em alguns e especulações equivocadas em outros. A grande questão tangente nas mídias sobre o tema Igreja é: O Papa e a reforma do Catolicismo, haja vista os pequenos gestos de simplicidade e humildade dele, os quais sinalizam como será seu papado que está apenas começando...
             
Pertinente é fazer as devidas ponderações sobre assuntos midiatizados envolvendo a religiosidade católica e o novo Papa, dado que é equivocado pensar que ele irá modificar de certa forma a fisionomia da Igreja a partir de um refundamento falacioso o qual prima por um relativismo sexual na moral cristã e pelo desprezo para com as vocações específicas. Enganam-se os que afirmam categoricamente isso com sensacionalismo intelectual ao utilizar premissas controvérsias como o uso da camisinha, o sexo sem procriação, a ordenação de mulheres e a inclusão de ex-padres hoje casados, a fim de legitimar esse tipo de raciocínio deturpador do genuíno caráter (identidade) Católico.
             
A Igreja não começa e nem termina com o Papa Francisco, ela apenas prossegue o seu caminhar eclesial no tempo e na história ao ser Sacramento de Salvação do gênero humano, como bem expressa a Constituição Dogmática Lumen Gentium, a qual descreve a gênese (origem) da Igreja não a partir de tendências épocais e sim do próprio mistério trinitário de Deus presente na história humana.
            
 Reformar não significa em hipótese alguma destruir e fazer rupturas com as bases essenciais da índole cristã que forma a catolicidade da Igreja em sua doutrina, vida e culto. A Igreja é uma hierarquia de dons e carismas em comunhão e missão e não um partido ideológico no qual se mudam as bandeiras por mera conveniência. Um exemplo é São Francisco de Assis, santo cujo nome foi escolhido pelo novo Papa. Francisco de Assis foi um reformador da Igreja em sua época no bom sentido do termo, por que ele buscou reforma – lá restaurando nela os princípios evangélicos (pobreza, castidade e obediência) na prática da vida cristã e não desfigurando o Corpo Místico de Cristo (a Igreja).
             
Essa é a tarefa apostólica do Papa Francisco, um Cardeal Jesuíta, que ao ser eleito Pontífice, inspirou-se na genuína espiritualidade franciscana que não destrói, mas reconstrói e ama a Igreja de Jesus Cristo Una, Santa Católica e Apostólica. Como membro da Companhia de Jesus, certamente fará uso da espiritualidade de Santo Inácio de Loyola na defesa da doutrina católica, apresentando-a ao mundo como proposta de uma vida nova em Cristo e não como fardo repressor conforme afirmam alguns intelectuais e até mesmo alguns teólogos católicos de determinadas tendências ideológicas.     
             
Nesse sentido o diálogo com a atualidade, já proposto pelos padres conciliares na Gaudium et Spes (Constituição Pastoral do Vaticano II), se encaixa no perfil papal de Francisco. Diálogo fraterno, aberto e respeitoso com o a realidade atual e não uma tentativa ideológica de fazer a Igreja mergulhar no relativismo hodierno que consome a sociedade mundial. A solidariedade da Igreja com a família humana universal não se edifica e cima de propostas imorais e anti-religiosas!
             
A moral católica e a disciplina específica de cada sacramento não se pautam em meras proibições, erram os intelectuais e teólogos que pensam assim: de maneira reducionista e partidária. Esses pensadores, que midiatizam suas análises críticas contraditórias, ignoram a eclesiologia, as bases da antropologia e moral cristã, bem como a natureza misteriosa dos sacramentos e suas finalidades específicas na vida e organização da Igreja. Por isso tentam legitimar suas opiniões deturpadas sobre esses temas ao comentarem sobre o novo Papa e seus desafios eclesiais contemporâneos a serem enfrentados, não com ideologias e sim com o auxílio do Espírito Santo que guia e santifica invisivelmente a Igreja.
             
Plutarco, filósofo e biógrafo grego, diz – “A chave para entender um grande homem não está nas conquistas em campos de batalhas ou em triunfos públicos, mas em suas vidas pessoais”. Portanto, para entender quem é como será o Papa Francisco em seu pontificado é preciso antes de tudo saber quem é e o que fez Jorge Mario Bergoglio em sua vida pessoal antes de se tornar o primeiro jesuíta, argentino e latino-amerciano Pontífice da Igreja Católica, a fim de não incorrer num prejulgamento errôneo de suas atitudes e posicionamentos papais futuros.