O Cristianismo e os excluídos
A finalidade da caridade cristã
Por Marcos Cassiano Dutra
“Mais
que comum dos dias, olhei o mais que pude os rostos dos pobres, gastos pela
fome, esmagados pelas humilhações, e neles descobri teu rosto, Cristo
Ressuscitado!”
Dom
Hélder Câmara
Sempre o tema dos excluídos causa
polêmica no interior dos debates religiosos, seja entre os que ignoram a
questão da exclusão social e da marginalidade no discurso de fé ou por parte
daqueles que supervalorizam um ativismo social em menosprezo da espiritualidade,
como força de fé que motiva a caridade e a fraternidade cristã.
Se olharmos para a história da vida
de Jesus Cristo, narrada pelos textos sagrados da Bíblia, veremos que sua ação
messiânica era de total predileção pastoral aos excluídos e marginalizados de
seu tempo, aos quais defendia a dignidade e convidava à conversão e eram por Ele
considerados os destinatários privilegiados do Evangelho. Tal opção jesuânica
preferencial pelos esquecidos do mundo é atestada em um dos evangelhos (Cf. Mt
25, 31-46), quando Ele mesmo diz: Eu tive fome, sede, estive enfermo, perseguido,
preso, nu e pedi auxílio. Cristo identificou-se totalmente com os explorados,
injustiçados e empobrescidos, e hoje, seus seguidores, os cristãos, são capazes
de viver essa virtuosa identificação evangélica com os mais carentes?
O alcance das palavras de Jesus é
perene, por que Nele o mistério de Deus habita em Pessoa e Obra. Mistério, cuja
natureza divina é infinita. Portanto, em que sentido as palavras, os gestos e a
ações do Bom Samaritano da humanidade (Jesus) continuam a questionar e fomentar,
em quem Nele
acredita e confia, sinceras atitudes de amor, compaixão e compromisso com o
próximo excluído e ignorado da sociedade contemporânea?
A dimensão da espiritualidade é necessária ao agir cristão, na mesma
intensidade que a relação entre fé e razão, ou seja, fé e vida caminham juntas!
Não se edifica o edifício evangélico da caridade sem uma fundante experiência
de fé com Jesus de Nazaré, sem fé a caridade cristã perde seu sentido e
torna-se mais uma ideologia no tempo e na história. Somente com a fé é possível
fazer o encontro pessoal e comunitário com Jesus Cristo vivo e presente nas
pessoas perseguidas e marginalizadas. É a fé sincera e comprometida que nos
torna capaz de enxergar, na fisionomia dos marginalizados e injustiçados, o
rosto pascal do crucificado-ressuscitado. Quem o descobre, nesse segredo de fé,
entende a essência da vida cristã e vive em santidade a prática da caridade e
da justiça, haja vista os exemplos de tantos como Madre Tereza de Calcutá, Irmã
Dulce, Dom Hélder Câmara, Francisco de Assis, Dom Bosco, entre tantos outros
homens e mulheres de fé e caridade transformadora.
O trecho da Gaudium et Spes -
Constituição Pastoral do Vaticano II – já aponta a diretriz da caridade
transformadora ao exortar: “As alegrias
e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos
pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças,
as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma
verdadeiramente humana que não encontre eco no seu coração.” Essa é a
finalidade da união íntima da Igreja com a família humana, a caridade que
dialoga e busca caminhos para promoção da dignidade dos filhos de Deus.
O tema Cristianismo e os excluídos
jamais deve sair do cenário das discussões religiosas, por que é imprescindível
essa reflexão e ação. Um Cristianismo surdo e cego frente à exclusão social de
milhões de pessoas, vítimas de um sistema político, social moral e religioso
demagógico, é tudo, menos comunidade de fé dos discípulos de Jesus Cristo. Isso
o próprio Papa Francisco deixou bem claro na primeira missa após sua eleição –
Cristianismo que não vive a essência da caridade cristã, que é Jesus Cristo, é
apenas uma piedosa ONG, mas não Igreja de Jesus Cristo.