segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

A ciência como expressão do conhecimento humano


A Filosofia da ciência
As teorias e métodos científicos na modernidade e contemporaneidade
Por Marcos Cassiano Dutra



Introdução     

            Para se entender o que é a ciência, é necessário entender e pesquisar a história do pensamento. Por que pensamos? Por que conhecemos?  - São as duas indagações pertinentes no estudo do processo cognoscitivo do pensamento humano em vista ao conhecimento, em virtude do qual se estrutura a ciência.
            O ser humano é um ser de experiência, as experiências humanas dependem do conhecimento. Portanto, o que o homem é, em grande medida, é o resultado do que ele conhece. Nesse sentido, “o conhecimento é a tentativa de se interpretar a linguagem da realidade, para se chegar a uma verdade.” Importante ter em mente que o conhecimento é o conjunto das abstrações da realidade e suas relações, também que para se chegar a uma possível verdade, é essencial haver uma conexão entre conhecimento, linguagem e realidade.
            A ciência propicia tal conexão ao oferecer teorias e métodos científicos, cada qual ao seu modo específico e em sua época específica buscou auxiliar o homem em sua saga natural pelo conhecimento. A Renascença é o período histórico marcante para o pensamento científico, dado que é a partir dela que se desenvolve a Revolução científica, tendo como expoente Galileu Galilei, e posterior a ele outros pensadores e cientistas que oferecem a humanidade reflexões filosófico-científicas plausíveis e pertinentes.

Galileu Galilei (1564-1642)

            “A realidade é um sistema de causalidades racionais rigorosas que podem e devem ser conhecidas e transformadas pelo homem”. Com essa premissa, Galileu Galilei retoma a teoria de Nicolau Copérnico sobre o heliocentrismo. Até então vigorava a tese científica geocêntrica, é com Galileu e por meio de sua invenção (o telescópio) que ele se torna o cientista mais famoso da Europa em sua época, fazendo de sua teoria a base da física moderna, a qual revolucionou o conhecimento sobre a astronomia e assim inaugurou a revolução científica moderna, dado que as antigas verdades científicas foram substituídas por verdades novas.
            Antes da chamada Revolução Copernicana ou Revolução Galileana, a lógica formal da não-contradição (especulação - dedução) era utilizada como instrumental científico. Galileu introduz uma nova lógica, a lógica do sentido, fundada não mais na especulação e sim nos paradoxos e no erro como caminhos para se chegar à verdade. Esse novo método experimental (indutivista) veio a proporcionar a resolução de problemas centrais da mecânica e da astronomia.
            A teoria científica anterior a Galileu, se embasava na cosmologia aristotélica, que considerava o cosmo como um movimento organizado e eterno. Se o universo é perfeito, ele precisa ser necessariamente eterno – pensava Aristóteles. O cosmo organizado é regido pelo motor imóvel, que vem a ser a terra. Logo, o mundo tende a ser perfeito por que o cosmo assim o é e o mundo em virtude disso tem um fim, por que possue uma finalidade: ser o centro do universo. Por isso geocentrismo, por que o planeta terra, nessa tese, é o centro do universo, todos os demais sistemas planetários, giram em torno da terra, motor imóvel que tudo organiza no cosmo em perfeição. 
            Galilei é contrário a essa tese e retoma a teoria de Copérnico, dando a ela maior sustentabilidade científica. Galileu defende que o universo não é perfeito e que para se compreender o universo é necessário o domínio matemático, pois segundo ele, Deus usou da matemática para formar o universo. Portanto, a terra não é o centro do universo e sim o sol. Todos os planetas em torno dele giram.

Francis Bacon (1561-1626)
            Outro pensador moderno de grande importância para a filosofia da ciência é Francis Bacon. Sua premissa fundamental era: “saber é poder”. Bacon, assim como Galileu é um indutivista (defende a experiência e não a especulação – dedução). O saber é poder por que a ciência possui uma utilidade: contribuir para a melhoria das condições de vida do homem, por isso ela deve ser aplicada para o progresso humano. Em suma, o conhecimento não tem um valor em si, mas sim pelos resultados práticos que ele possa gerar.  
            Crendo e defendendo a praticidade e a utilidade da ciência, Bacon não propõe uma teoria e sim um método, o Novo Organum. Esse método tem por finalidade usar da lógica para apoiar as teorias das descobertas científicas, a fim de aumentar a capacidade do homem sobre a natureza, isto é, seu domínio. Francis Bacon é indutivista, pois o método indutivo, para a ciência moderna, é a fonte da verdade.
            Seus passos para o conhecimento são; observação rigorosa, hipótese, validação e teoria válida. Todavia, é necessário saber que “aquele que começa uma investigação repleto de certezas, terminará cheio de dúvidas” – Diz Bacon. Por isso é preciso destruir paulatinamente os ídolos, somente assim a observação será determinante para o método, por que a indução só é possível se quebrados os ídolos.
            Bacon divide os ídolos em quatro:

·        Ídolo da tribo (fundado na natureza humana)

·        Ídolo da caverna (fundado nos homens enquanto indivíduos)

·        Ídolo de foro (fundado na sociedade e nas palavras impostas)

·        Ídolo do teatro (fundado nas filosofias adotadas como verdade únicas)

           
A ciência na contemporaneidade

            Na contemporaneidade dois pensadores da filosofia da ciência merecem destaque, são eles, Karl Popper e Thomas Kuhn. Cada qual, ao seu modo, deu contribuições elementares ao pensamente científico na atualidade.

Karl Popper (1902-1994)
            Foi um filósofo da ciência austríaco e naturalizado britânico. Estudiosos afirmam ser ele o pensador mais importante do Século XX por ter tematizado à ciência. Popper não é indutivista, e sim dedutivista. Sua teoria científica centra-se no quesito de fazer a distinção entre o que é ou não é a ciência. Para ele o conhecimento humano consiste em teorias, hipóteses e conjecturas que o homem formula como produtos de sua atividade intelectual. Nisso se embasa a teoria da demarcação, obra mais importante de Popper. A demarcação estrutura-se substancialmente nas possibilidades, ou seja, nas probabilidades de refutação ou falseamento de uma teoria científica. A medida em que uma verdade cientifica é passível ser falseada ou corroborada, ela se mostrará realmente verdadeira ou falsa. Karl Popper relaciona-se muito com o pensamento cartesiano de René Descartes em sua teoria do conhecimento. Descartes parte da dúvida metódica para se chegar a uma possível verdade indubitável acerca do conhecimento humano. Popper parte das possibilidades de falsear uma tese científica para se chegar uma real verdade dos fatos. Nessa perspectiva sua teoria da demarcação assemelha-se a uma dialética cartesiano-científica.
            Em suma, a teoria científica de Popper firma-se na construção progressiva de uma verdade das “coisas”, não propondo caminhos ou métodos que conduzam invariavelmente a verdade e sim pela especulação o acesso a chance de alguns enunciados verdadeiros acerca da realidade.   

Thomas Kuhn (1922-1996)
            Foi um físico e filósofo da ciência estadunidense.  Seu trabalho embasou-se sobre história da ciência e filosofia da ciência, tornando-se um marco no estudo do processo que leva ao desenvolvimento científico. Kuhn rejeita o dedutivismo e o indutivismo. Ele considera a ciência um processo cíclico e não linear, faz também a divisão de duas fases importantes na ciência: 1) A ciência natural e 2) A crise.
            Trabalha cientificamente com os paradigmas. Kuhn afirma que a ciência acontece e se desenvolve a partir dos paradigmas, que para ele tem o sentido de exemplo (modelo). A teoria científica de Thomas Kuhn, como já foi dito, é cíclica, ou seja, um processo que não se acaba e sim trabalha com paradigmas, que estão em constante renovação para garantir uma verdade em seu tempo histórico.
            O processo científico cíclico de Kuhn estrutura-se da seguinte forma:
·        Paradigma: Conjunto de conceitos e teorias vigentes diante de novos conhecimentos.

·        Ciência normal ou nova: Investigação que se baseia em problemas e uma comunidade científica reconhece, em particular, durante um período.

·        Crise ou anomalia: Fatos que os cientistas não conseguem resolver. Não refutando e sim colocando em experiência, partindo do paradigma. Ás vezes ignoram o problema, culpando ou não.

·        Revolução: Abandono de um paradigma adotado por toda a comunidade científica. Mudança de visão de mundo, mudança de pensamento.    

            A teoria científica de Thomas Kuhn assemelha-se a teoria filosófica de Friedrich Hegel, na qual se organiza o pensamento em tese, antítese e síntese. Kuhn faz basicamente o mesmo com a ciência ao recorrer a uma dialética científico-hegeliana, partindo do paradigma, que gera uma nova ciência e dela faz surgir uma crise, por meio da qual se chega a uma revolução do pensamento e da visão de mundo.  

Conclusão
            A filosofia da ciência não é algo acabado e sim em constante construção, as teorias e métodos de ontem e hoje, colaboram para com o pensamento científico atual, dando instrumentais intelectuais e práticos ao ser humano em sua sede pelo conhecimento.
 

sábado, 15 de dezembro de 2012

Celebrando o Ano da Fé



50 anos do Vaticano II
A Igreja que renasce no concílio
Por Marcos Cassiano Dutra



Introdução

            Entre os anos de 1962 a 1965 acontece o Concílio Ecumênico Vaticano II, grande evento eclesial da Igreja no Século XX, o qual comemoramos 50 anos de sua solene abertura. Dezesseis documentos formam o corpo teórico-doutrinal do Vaticano II, dentre eles um merece especial destaque, é a Constituição Dogmática Lumen Gentium, que tratou de um dos temas centrais da reunião conciliar, a Igreja, a eclesiologia, ou seja, o que vem a ser a Igreja, qual seu papel apostólico, missionário e catequético.
            Até então vigorava a tese teológica da “societas perfecta”, fruto da mentalidade advinda dos concílios de Trento e Vaticano I, que concebiam a Igreja como uma sociedade perfeita sem ruga, nem mancha, o reino de Deus institucionalizado que se resumia na hierarquia (papa, bispos, padres). A eclesiologia de comunhão que o Vaticano II assume e difundi, rompe com tal premissa da sociedade perfeita ao chamar a Igreja de santa e pecadora, sempre necessitada e no caminho da conversão. Igreja que não é o reino, porém está a serviço do reino no mundo e por isso mesmo é sacramento de salvação aos homens e mulheres na história.
           
A constituição dogmática conciliar
A Lumen Gentium aponta e recupera o caráter trinitário e comunitário da Igreja “querida pelo Pai, fundada pelo Filho e santificada no Espírito Santo”. Uma Igreja que é sacramental e ao mesmo tempo ministerial, uma Igreja que é hierarquia de dons e carismas e acima de tudo é um mistério sagrado tornado realidade ao se fazer rebanho do Senhor, povo de Deus, já prefigurado no Antigo Testamento em Israel e cristificado no Novo Testamento em Jesus, o qual a funda e firma na rocha da fé de Pedro, escolhido para ser aquele que confirma os irmãos na fé e os Apóstolos, seus Sagrados Pastores no múnus de reger, ensinar e santificar a Grei do Senhor em comunhão com o Sumo Pontífice. Igreja que é uma irmandade de vocacionados que pelo Batismo possuem a mesma dignidade e cidadania eclesial – são cristãos.    
            O bondoso Papa João XXIII (que intuiu e convocou o concílio) assim afirmava – “A Igreja Católica não é um museu de arqueologia. Ela é como a antiga fonte do vilarejo que dá água ás gerações, como a deu áquelas do passado”. Essa frase do beatíssimo papa ressoou de maneira providencial nas discussões que levaram adiante os projetos da Lumen Gentium; afinal o Vaticano II é profundamente marcado pela personalidade do Papa João. A pergunta crucial que ajudou a desenvolver a teologia eclesial desta Constituição Dogmática foi – Igreja, o que dizes de ti mesma?
              Sem dúvida, mais que a liturgia, a eclesiologia do Vaticano II, é a grande responsável pela fisionomia eclesiástica que o providencial concílio assumiu depois de seu encerramento. O rosto da Igreja transfigurou-se, não a partir de elementos exteriores como os costumes terrenos e sim a partir da essência misteriosa e espiritual que envolve a existência da Igreja, que é Cristo. Em Cristo tudo é novo, e, a Igreja nele é sempre nova e atual, pois o Evangelho não se altera se pereniza na história como proposta de uma vida e um mundo diferente em Deus. Assim é a Igreja, “caminha pelo mundo em perene juventude, embora antiga desde a época dos Apóstolos” – realça João XXIII em sua primeira Encíclica “Ad Petri Cathedram”. Assim se concretiza a utopia do “aggiornamento”, da atualização. Entendendo que a tradição é uma fonte que se renova e o depósito da fé como um tesouro de vida do qual brota, de maneira sacramental, o sagrado e não como um baú empoeirado e cheio de quinquilharias, anátemas e excomunhões.
           

Pensar a Igreja hoje com a Lumen Gentium
Dom Aloísio, Cardeal Lorscheider (In Memorian) conclui dizendo – “O Vaticano II não veio para definir e condenar, mas para servir e amar”. O remédio da salvação não é a severidade, e sim a pastoralidade. Vaticano II, primeiro concílio pastoral da história da Igreja, nos apresenta uma face belíssima da Igreja de Cristo ao compreender que a catolicidade não é tão somente cristandade é a comunhão da Igreja consigo mesma e com o mundo, em sua relação apostólico-social com a família humana universal.          
            A Igreja renasce com o Concílio Vaticano II, que propôs um revisitar o núcleo eclesial de onde emana a tradição, isto é, a transmissão da fé, que são as primeiras comunidades cristãs na época dos Apóstolos e posteriormente na época da Patrística. Hoje, cinqüenta anos depois, como redefinir a identidade da Igreja a partir Lumen Gentium? Qual modelo de Igreja está em vigor? Onde se avançou? Em que se retrocedeu? E qual a perspectiva eclesial para o futuro? - são essas as cinco perguntas eclesiológicas pertinentes na celebração do Ano da Fé em ação de graças pelo Concílio Vaticano II.


A vida humana em relações



Hermenêutica do corpo II
A natureza do celibato
Por Marcos Cassiano Dutra


Introdução
No artigo anterior se refletiu acerca do corpo humano em sua mais excelsa unidade existencial na sexualidade e no sexo. Neste texto falar-se-á do corpo humano enquanto celibatário, sendo essa uma opção livre e consciente de exercício da sexualidade dentro do aspecto humano-religioso da consagração e ordenação sacramental. Celibato é uma palavra de origem latina (Caelibatus) que significa “não casado” - celibatário é, portanto, aquela pessoa (homem ou mulher) que por convicções vocacionais abre mão de sua intimidade genital (capacidade procriativa), e opta pelo celibato como caminho virtuoso de vivência da vocação e exercício integral de seu existir nas relações humanas que envolvem o caráter sexual da afetividade, todavia nesse caso a sexualidade é entendida como aptidão de amar a todos sem distinção ou interesse íntimo, pois o sexo aqui é visto como oblação (oferta) total de si ao mistério de Deus, presente na vocação e que completa inteiramente os vocacionados e vocacionadas praticantes desse estilo específico de castidade.

Apologia celibatária
Equivoca-se ideologicamente que não têm a devida sensibilidade intelectual e humana para entender que o celibato não é uma fuga de si da realidade secular ou uma repressão religiosa da genitalidade. O celibato é a virtude humana específica daqueles que por amor a Cristo e a Igreja colocam toda a sua existência (corpo, mente e alma) a serviço do Senhor, que os chama a um projeto e estado de vida distinta dos padrões usuais, porém especial e sagrado diante de Deus e dos homens e mulheres de boa vontade.  
O celibato torna-se um peso ou fardo na vida dos vocacionados que ao longo do caminho, por motivos variados e ambientes diversos, perdem a motivação e espiritualidade necessárias ao bom êxito desse estado de vida ou por que ao discernirem concluem não serem chamados realmente a essa vocação específica. O celibato não é um problema, é um desafio de santidade aos que têm nas mãos o tesouro da vida religiosa e sacerdotal a cultivar. Problemas de ordem sexual envolvendo celibatários são oriundos de situações humanas e fatos isolados, cada caso é um caso. A sacralidade do celibato permanece a mesma, sua eficácia depende do compromisso pessoal de quem por ela optou livre e consciente. Inúmeros são os exemplos de homens e mulheres virtuosos que viveram de maneira exemplar o celibato, a vida deles é modelo de esperança nesse sentido.

Aspectos humanísticos do celibato
O celibato é também caminho para o autoconhecimento, sendo assim, o celibato favorece o discernimento vocacional de rapazes e moças que, ao longo do processo formativo para a consagração e a ordenação já se inserem nesse estado de vida, buscando amadurecer suas vidas, mentalidade e afetos por meio da ascese espiritual na mística vocacional celibatária.
Celibato, dentro do Catolicismo, não é imposição! É uma opção e disciplina eclesiástica para um comportamento humano equilibrado diante da prática cotidiana da vocação específica à vida religiosa e sacerdotal.
A genitalidade humana não está esquecida no celibato, ela está presente! Não de maneira erótica e sim pastoral. A pastoralidade da vocação é uma expressão da sexualidade dos consagrados (das) e ordenados. O corpo humano não está sepultado no celibato, ele está presente e atuante, não na sensualidade estética do conquistar sexual e sim na capacidade de colocar todo o vigor e as faculdades humanas em vista da vocação. É isso que realiza e completa existencialmente a vida dos homens e mulheres celibatários em sua integridade corporal.   

Conclusão
São Bernardo de Claraval diz – “Onde o amor emerge, ele supera todos os outros impulsos e sublima-os em amor”. Assim acontece com a sexualidade e o sexo dentro do celibato, os quais emergem livre e consciente do amor intenso pela vocação, de forma que todos os impulsos transcendem a esfera do erótico e sublimam-se na esfera ascética do sagrado na gratuidade vocacional.
 

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

A vida humana em relações


 Hermenêutica do corpo I
A natureza da sexualidade e do sexo
Por Marcos Cassiano Dutra

 Introdução
O corpo sempre foi objeto de grandes especulações filosóficas, biológicas e teológicas ao longo dos séculos. Hoje a humanidade especula o corpo a partir da ciência e da tecnologia, dois conhecimentos, um advindo da modernidade e o outro da contemporaneidade histórica. Falar sobre o corpo é falar sobre o ser humano. Nem os corpos celestes e o dos animais chamam tanto a atenção intelectual e estética como a anatomia humana, pois o homem tem em si a necessidade de querer conhecer-se, e o corpo é esse caminho. Corpo que é sexuado. Logo, dizer algo sobre a corporeidade é discorrer a respeito da sexualidade e do sexo.
O corpo e sua profunda interligação com o sexo é não só objeto de estudo e pesquisa como autoconhecimento. É por meio do exercício sexual (quer seja ele genital ou afetivo) que o homem descobre o outro lado de sua humanidade – o desejo e o prazer. Além das qualidades naturais de liberdade e consciência, o homem é dotado de desejos e prazeres. A busca incansável pela felicidade e a realização é o efeito temporal da causa abstrata dos desejos e prazeres, presentes na mente humana.

O desejo e o prazer
Desejar e sentir prazer são, portanto, ações que humanizam, dado que não é ocaso e nem relativo, está envolto pela moralidade e a ética. Sexo e sexualidade não são algo paralelo à moral, antes resultados comportamentais dela. Sexo e sexualidade desmoralizados não produzem a conclusão esperada – o autoconhecimento e equilíbrio das emoções e paixões. Sem moralidade a sexualidade se degrada na ideologia do descartável e o sexo se torna produto do mercado sexual.
É um equívoco afirmar que o prazer se encerra em si mesmo. Isso acontece devido ao sentimento pocessivo-sexual, que é um fenômeno do emocional humano. Nem todas as pessoas têm essa característica. O prazer aqui significa ser presença. A sexualidade torna o homem presença geradora de afetos, de fraternidades e o sexo presença geradora de unidade íntima e vida. Todas as demais faculdades humanas se ligam a área da sexualidade, por que as faculdades humanas são parte daquele cujo corpo é sexuado - o ser humano. Por isso que consciência e liberdade auxiliam para uma sexualidade saudável, visto que ajudam o homem a examinar suas ações sexuais antes, durante e depois.
A repressão dos desejos e prazeres não contribui com a humanização, apenas geram pessoas sexualmente não realizadas. É uma ilusão querer ser gente sem a sexualização natural de seu eu-humano. Reprimir, assim como a desmoralização, desumaniza a genitalidade humana.           Ser humano é ser corpo sexual. Retirar essa identidade específica do homem é esvaziá-lo em sua existência daquilo que lhe é especial. Todas as ações humanas são atitudes sexuais, dado que é por meio da força vital da sexualidade que se constrói a afetividade, que é a capacidade de amar e ser amado, bem como do respeito ao outro que também é humanamente sexual. O moralismo ignora esses aspectos e por isso incrimina a sexualidade e demoniza o sexo. Moralismo é desequilíbrio psicossexual na mesma intensidade da desmoralização, e, como todo desequilíbrio, só desfavorece a própria pessoa humana em seu amadurecimento sexual.

Uma nova perspectiva
Importante saber que a sexualidade não se limita, nem se reduz a relação sexual genital, essa é uma forma distinta de exercício da sexualidade. A sociedade é um convívio de sexualidades, é uma relação de corpos que temporalmente edificam juntos uma história. Logo, a história da humanidade é a história da sexualidade. Portanto, a harmonia entre humanidade e sexualidade é a via saudável que contribui naturalmente para inter-relação consigo e com o próximo.
São oportunas as palavras do pensador cristão Leonardo Boff a esse respeito – “A sexualidade revela o relacionamento e a comunhão entre diferentes. Tal unificação é carregada de sentido, pois a vida se estrutura ao redor da simbiose, de trocas e de comunhão de sentimentos, de materiais e de energias. Esta realidade espelha de forma densa o mistério fontal escondido e sempre se revelando e entrando em comunhão com o diferente” (Livro Cristianismo o mínimo do mínimo, Editora Vozes).
Frente ao erotismo e ao puritanismo (seja ele qual for em suas mais diferentes manifestações), a busca pela compreensão abrangente e coerente do sexo e sexualidade se faz oportuna. Uma antropologia sexual é o desafio atual para aqueles e aquelas que desejam humanizar o caráter sexual do ser humano em sua comunhão natural consigo e com os demais. Sexualidade que possui três formas específicas de manifestação - é erótica, filial e ágape. Sexualidade que é expressão da vida, da natureza, que compõe a existência de um dos seres vivos chamado de humano.