A Igreja e as mazelas sociais
A Reforma agrária e urbana
Por Marcos Cassiano Dutra
Os direitos humanos e o Evangelho
se relacionam profundamente, uma vez que o reino de Deus é em si, em Cristo,
vida em plenitude para a humanidade. Promover e defender os direitos do homem é
edificar o edifício profético do reino de Deus na concretude da realidade. As reformas
agrária e urbana são, portanto, dois sinais concretos desse reino que Cristo,
em vida, difundiu com seus gestos, palavras e ações.
Como
rezar diante do altar se no campo há conflitos entre latifundiários e
camponeses sem terra? Como dizer amém se nas grandes metrópoles à miséria
marginaliza tantos filhos de Deus em situação insalubre e desumana nas favelas,
calçadas e casebres?
É
tarefa da Igreja fomentar nos fiéis um sincero e evangélico engajamento social
nas organizações que visam a defesa de quem mora no campo e na cidade. A ação
social cristã é dever de todo crente e não mera teoria religiosa. Sem uma ação
efetiva por parte dos que acreditam na possibilidade da justiça e da
fraternidade, torna-se impossível a promoção da dignidade humana e uma vida
cristã coerente com o projeto salvífico de Jesus, que é vida plena para
todos.
A
terra é herança de Deus, Senhor do tempo e da história. Dele recebemos a
criação para sermos seus zeladores e continuadores. Terra herdada de Deus deve
ser partilhada entre irmãos. Entretanto a ambição desfigura o coração para a
virtude da partilha, semeando sementes de sangue e fincando cercas patrocinadas
pelo capital.
A
moradia digna é uma questão de saúde. É repudiante a situação miserável de muitos
brasileiros, largados à mercê de assistencialismos fajutos, que não solucionam
o problema da desigualdade social com migalhas vindas dos cofres públicos para
aqueles que sobrevivem em uma realidade caótica, violenta e desumanizante nas
encostas de morros ou nas margens de rios. A casa própria é direito de quem
trabalha e paga, a preço de ouro, os impostos e demais tarifas. O lar é um
direito sagrado inviolável. Basta de mansões e casebres contracenando luxo e
miséria na paisagem.
As
reformas agrária e urbana são assunto atual, equivoca-se quem ignora esses
problemas sociais, seja nos gabinetes da politicagem ou nos altares da
alienação religiosa, que canta aleluias enquanto o povo de Deus morre de fome e
sede de vida, dignidade e esperança.
Falacioso
é o discurso que considera marxista qualquer compromisso social da Igreja. O
próprio Papa Paulo VI, na Encíclica Populorum Progressio, em 1967, já atestava
que a justiça social é necessária para o desenvolvimento dos povos. E a esse
respeito dizia – “Ninguém está autorizado a reservar para seu uso exclusivo o
que supera a sua necessidade, quando aos outros falta o necessário”. Algo
profundamente ligado ao que o grande Santo Ambrósio afirmava, ““Não é o que tu tens que doas ao pobre. Nada mais
fazes senão dar-lhe o que a ele mesmo pertence. Pois aquilo que tomas entre
teus bens é na verdade o que é dado em comum para o uso de todos. A terra é
dada a todos, não somente aos ricos”.
Povos
da opulência e povos da fome, como bem expressa a Populorum Progressio, são as
duas forças sociais que levam ao conflito de civilizações gerador de
empobrecimento e morte. “Entre as civilizações, como entre as pessoas, um
diálogo sincero cria efetivamente a fraternidade” – Conclui Paulo VI nessa
Encíclica. Hoje, passados mais de 40 anos da publicação desse documento
pontifício, seu conteúdo continua atual, e ajuda a empenharmos em nosso
compromisso cristão a serviço da vida e da esperança para aqueles e aquelas aos
quais é negado o direito de serem totalmente humanos no pleno gozo de seus
direitos humanitários, que são a causa do próprio Evangelho e do reino de Deus,
do qual a Igreja é instrumento e Sacramento de Salvação integral do gênero
humano.
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