Formação aos os leitores e leitoras
O ministério do leitorado na
liturgia
Por Marcos Cassiano Dutra
Introdução
Bíblia é uma
palavra de origem grega, significa livros. Sagrada significa que tudo quanto
está escrito em seus livros é algo divinamente valioso. Portanto, a Bíblia Sagrada
é a união de vários livros que contam uma história bela e de fé, a história do
povo de Deus, a história da salvação, bem como orienta a vida cristã em seus
livros aconselhadores, que a teologia chama de sapienciais. Antigo e Novo
Testamento formam a Bíblia Sagrada. O Novo Testamento, em Jesus Cristo, ilumina
tudo quanto fora escrito e profetizado no Antigo.
Sábia é a
premissa bíblica que diz: “A Bíblia é Palavra do Deus do povo e palavra do povo
de Deus”. Essas duas realidades literárias e misteriosas envolvem de fé o
conteúdo da Sagrada Escritura. Deus é o inspirador da Bíblia, que se utilizou
de mãos humanas, para redigir sua mensagem e comunicá-la a humanidade,
revelando-se de maneira total em
seu Filho que veio para ser não mais a inspiração dos profetas,
mas o próprio Deus Conosco se comunicando em gestos, palavras e ações. Vale à pena mergulhar o intelectum fidei (intelecto da fé) no estudo bíblico, porque
fortalece e amadurece a nossa fé cristã.
O
Papa Bento XVI, na Exortação Apostólica Verbum Domine, ao falar sobre o
ministério de leitores, diz que ele é essencialmente um ofício destinado aos
fiéis cristãos leigos, os quais devem receber uma formação bíblica, litúrgica e
técnica, a fim de contribuírem mais e mais na proclamação eloquente da Palavra
de Deus nas celebrações.
Esse
artigo formativo tem por objetivo os três passos propostos pelo Papa, além de
fomentar nos leitores e leitoras de nossa comunidade paroquial uma
espiritualidade bíblica, a qual ajude-os a bem desenvolver esse serviço
litúrgico importante.
Formação bíblica
Um provérbio
latino diz que, “reverenciar a Sagrada Escritura é reverenciar o próprio Jesus
Cristo”. Jesus é o personagem bíblico mais importante, por que é o próprio
Deus, que se revela na criação em seu mistério de amor para com a humanidade e
vai se revelando de maneira paulatina por meio de seus patriarcas, profetas e
autores dos demais livros sagrados, bem como por meio da história de seu povo,
com o qual estabelece uma Aliança. Jesus é aquele que sela definitivamente a Eterna
Aliança e dá cumprimento a todas as profecias do Antigo Testamento que direta
ou indiretamente falavam ao seu respeito, dado que Jesus é o Messias esperado e
predito.
A
Bíblia Sagrada é uma história de amor entre Deus e seu povo. Povo que muitas
vezes não foi fiel a Aliança, Deus que jamais deixou de acreditar na
possibilidade de salvação do ser humano. Jesus Cristo, Deus humanizado,
encarnado, é o feito maior do amor de Deus pela humanidade. Não poupou o seu
Filho para conquistar a si o gênero humano de maneira integral, redimindo e
salvando-o.
Os
demais personagens bíblicos são exemplos de fidelidade na fé e de que é
possível viver uma vida segundo os desígnios do Senhor. Tais personagens
representam a humanidade, santa e pecadora, necessitada sempre da graça de
Deus. Deles aprende-se que a perseverança na fé e a vivência da vocação,
realizam a natureza humana e promovem o reino de Deus no mundo.
A
linguagem um tanto quanto que simbólica e figurada de alguns textos sagrados,
nos oferecem uma fonte de pesquisa do contexto e do pretexto, presentes em cada
escrito bíblico. O texto só é possível de se compreender levando em conta o seu
contexto. Diz João Paulo II – “A ignorância é o pior inimigo da nossa fé”.
Ignorar o contexto e os pretextos bíblicos é caducar a Sagrada Escritura e
reduzí-la a uma leitura literal e fundamentalista, a qual somente fomenta o
fanatismo religioso.
Bela
é uma das conclusões da Dei Verbum, Constituição Dogmática do Vaticano II sobre
a Palavra de Deus, nela assim está expresso: “Nos Livros Sagrados, o Pai que
está nos céus vem amorosamente ao encontro dos seus filhos a conversar com
eles; e é tão grande a força e a virtude da Palavra de Deus, que se torna o
apoio vigoroso da Igreja, a solidez da fé para os filhos da Igreja, o alimento
da alma e a fonte pura e perene da vida espiritual”.
Formação litúrgica
No Capítulo VI da
Dei Verbum está escrito – “A Igreja teve sempre grande veneração as divinas
Escrituras, como fez com o próprio Corpo
do Senhor, não deixando jamais, sobretudo na Sagrada Liturgia, de se alimentar
do pão da vida à mesa, quer da Palavra de Deus, quer do Corpo de Cristo, e de distribuí-lo
aos fiéis”.
Dessa
veneração nasce à liturgia da Palavra, que se faz presente em todas as
celebrações litúrgicas da Igreja, especialmente a Missa. A Palavra de Deus nos
ajuda a entender o mistério e viver os sacramentos. A Sagrada Escritura, junto
a Sagrada Tradição, formam o depósito da Fé. Na Sagrada Escritura temos o
mistério de Deus presente e na Sagrada Tradição a interpretação segura desse
mistério por meio do Magistério, ao qual é confiada essa missão, visto que são
assistidos pelo Espírito Santo, guia e intérprete da Palavra de Deus. Deus se
revela por meio dos textos sagrados e da vivência de fé da Igreja (experiência
religiosa).
Tudo
isso se faz presente na liturgia. Palavra de Deus proclamada e meditada de
acordo com a Teologia Católica, que tem seu apoio perene na Palavra de Deus
escrita, juntamente com a Sagrada Tradição, “nela (na teologia) se consolida firmemente
e se rejuvenesce cada vez mais, investigando, à luz da fé, toda verdade contida
no mistério de Cristo” (Dei Verbum 24).
Os
tempos e anos litúrgicos são enriquecidos pela Palavra de Deus. Em cada tempo a
Sagrada Escritura nos oferece passagens bíblicas específicas para se vivenciar
a espiritualidade particular de cada período litúrgico. Nos anos litúrgicos nos
oferece a característica distinta de cada evangelista mostrar a fisionomia e
ação messiânica do Filho de Deus. Nas solenidade, chaves de leitura para se
contemplar mais e mais os mistérios da salvação. De modo que a fé cristã
católica vai se amadurecendo por meio da leitura, escuta e reflexão da mensagem
sagrada presente na Bíblia, a cada celebração.
Formação técnica
A proclamação da
Palavra de Deus, exige de quem a faz um sério treinamento. Uma leitura mal
feita, prejudica toda a homilia. Os fiéis tem o direito de entender a mensagem
sagrada e os leitores e leitoras o dever de expressarem de maneira eloquente
tal conteúdo. Importante é saber que ser leitor (ra) não é uma alegoria e sim
um verdadeiro ministério (serviço) litúrgico. “Os leitores e leitoras não estão
aí para ajudar o padre, como muitos continuam pensando. Assumem um ministério
próprio, atuam a partir de seu sacerdócio de batizados.”
“Não
trabalham por conta própria, mas como representantes de Cristo, animados por
seu Espírito. É Cristo mesmo que fala quando se lêem as Sagradas Escrituras na
Igreja” (SC, n. 7). [1]
Não
basta simplesmente ler, é necessário proclamar a leitura como Palavra de Deus.
Palavra de vida, amor, bondade, libertação, correção, a qual deve atingir os
ouvintes quando transmitida. Proclamar a Palavra de Deus não como um fato
passado e sim como uma mensagem de fé que ressoa no hoje de nossa história, em
nossas alegrias, tristezas, problemas, conflitos, conquistas, buscas e tensões.
Quando
proclamada, a Palavra de Deus deve penetrar a realidade histórica e social. Sua
força sagrada deve infundir a riqueza inefável do mistério de Deus na vida dos
ouvintes, pois “quando se lêem as Sagradas Escrituras na Igreja, é Cristo mesmo
que fala” (SC, n.7).
O
leitor e a leitora são servidores da Palavra de Deus como porta-vozes do
Senhor. Jamais falam em seu próprio nome, mas em nome do Senhor, como
instrumentos de ligação entre Cristo e seu povo, fazendo-se canais de
comunicação do Sagrado.
Conclusão
O ministério de
leitor exige de quem o exerce uma generosa responsabilidade, treino e estudo da
Bíblia Sagrada. Sem uma intimidade com a Palavra de Deus, é impossível bem
proclamá-la. Para tanto, cultivar uma espiritualidade bíblica é uma boa dica. A
lectio divina, isto é, a leitura orante da Sagrada Escritura ajuda o leitor e a
leitora a bem desenvolver de maneira frutuosa seu ministério na comunidade
paroquial. Entonação de voz, postura corporal, expressividade facial e
respiração adequada, devem ser a característica específica dos leitores. A voz,
o corpo, a face, o olhar e os pulmões, todos colocados a serviço da Palavra de
Deus. Por meio de nossos corpos damos graças a Deus, proclamamos sua palavra e
construímos seu reino.
A
linguagem humana é utilizada por Deus para continuar comunicando sua graça e
amor à humanidade. Isso acontece por meio de sua Palavra Sagrada e também pela
proclamação dela à comunidade de fé. Bem-Aventurados os leitores e leitoras que
vivem essa mística litúrgica e colaboram na compreensão da Sagrada Escritura.
[1] Livro: O
ministério de leitores e salmistas, Paulinas Editora
SC – Sacrosanctum Concilium (Constituição Litúrgica do
Vaticano II)
Dei Verbum – Constituição Dogmática do Vaticano II
sobre a Palavra de Deus