Hermenêutica do corpo I
A natureza da sexualidade e do
sexo
Por Marcos Cassiano Dutra
Introdução
O corpo sempre foi objeto de grandes especulações filosóficas, biológicas
e teológicas ao longo dos séculos. Hoje a humanidade especula o corpo a partir
da ciência e da tecnologia, dois conhecimentos, um advindo da modernidade e o
outro da contemporaneidade histórica. Falar sobre o corpo é falar sobre o ser
humano. Nem os corpos celestes e o dos animais chamam tanto a atenção
intelectual e estética como a anatomia humana, pois o homem tem em si a
necessidade de querer conhecer-se, e o corpo é esse caminho. Corpo que é
sexuado. Logo, dizer algo sobre a corporeidade é discorrer a respeito da
sexualidade e do sexo.
O corpo e sua profunda interligação com o sexo é não só objeto de estudo
e pesquisa como autoconhecimento. É por meio do exercício sexual (quer seja ele
genital ou afetivo) que o homem descobre o outro lado de sua humanidade – o
desejo e o prazer. Além das qualidades naturais de liberdade e consciência, o
homem é dotado de desejos e prazeres. A busca incansável pela felicidade e a
realização é o efeito temporal da causa abstrata dos desejos e prazeres,
presentes na mente humana.
O desejo e o prazer
Desejar e sentir prazer são, portanto, ações que humanizam, dado que não
é ocaso e nem relativo, está envolto pela moralidade e a ética. Sexo e sexualidade
não são algo paralelo à moral, antes resultados comportamentais dela. Sexo e
sexualidade desmoralizados não produzem a conclusão esperada – o
autoconhecimento e equilíbrio das emoções e paixões. Sem moralidade a
sexualidade se degrada na ideologia do descartável e o sexo se torna produto do
mercado sexual.
É um equívoco afirmar que o prazer se encerra em si mesmo. Isso acontece
devido ao sentimento pocessivo-sexual, que é um fenômeno do emocional humano.
Nem todas as pessoas têm essa característica. O prazer aqui significa ser
presença. A sexualidade torna o homem presença geradora de afetos, de
fraternidades e o sexo presença geradora de unidade íntima e vida. Todas as
demais faculdades humanas se ligam a área da sexualidade, por que as faculdades
humanas são parte daquele cujo corpo é sexuado - o ser humano. Por isso que
consciência e liberdade auxiliam para uma sexualidade saudável, visto que
ajudam o homem a examinar suas ações sexuais antes, durante e depois.
A repressão dos desejos e prazeres não contribui com a humanização,
apenas geram pessoas sexualmente não realizadas. É uma ilusão querer ser gente
sem a sexualização natural de seu eu-humano. Reprimir, assim como a
desmoralização, desumaniza a genitalidade humana. Ser humano é ser corpo sexual. Retirar essa identidade
específica do homem é esvaziá-lo em sua existência daquilo que lhe é especial.
Todas as ações humanas são atitudes sexuais, dado que é por meio da força vital
da sexualidade que se constrói a afetividade, que é a capacidade de amar e ser
amado, bem como do respeito ao outro que também é humanamente sexual. O
moralismo ignora esses aspectos e por isso incrimina a sexualidade e demoniza o
sexo. Moralismo é desequilíbrio psicossexual na mesma intensidade da
desmoralização, e, como todo desequilíbrio, só desfavorece a própria pessoa
humana em seu amadurecimento sexual.
Uma nova perspectiva
Importante saber que a sexualidade não se limita, nem se reduz a relação
sexual genital, essa é uma forma distinta de exercício da sexualidade. A
sociedade é um convívio de sexualidades, é uma relação de corpos que
temporalmente edificam juntos uma história. Logo, a história da humanidade é a
história da sexualidade. Portanto, a harmonia entre humanidade e sexualidade é
a via saudável que contribui naturalmente para inter-relação consigo e com o
próximo.
São oportunas as palavras do pensador cristão Leonardo Boff a esse
respeito – “A sexualidade revela o
relacionamento e a comunhão entre diferentes. Tal unificação é carregada de
sentido, pois a vida se estrutura ao redor da simbiose, de trocas e de comunhão
de sentimentos, de materiais e de energias. Esta realidade espelha de forma
densa o mistério fontal escondido e sempre se revelando e entrando em comunhão
com o diferente” (Livro Cristianismo o mínimo do mínimo, Editora Vozes).
Frente ao erotismo e ao puritanismo (seja ele qual for em suas mais
diferentes manifestações), a busca pela compreensão abrangente e coerente do
sexo e sexualidade se faz oportuna. Uma antropologia sexual é o desafio atual
para aqueles e aquelas que desejam humanizar o caráter sexual do ser humano em
sua comunhão natural consigo e com os demais. Sexualidade que possui três
formas específicas de manifestação - é erótica, filial e ágape. Sexualidade que
é expressão da vida, da natureza, que compõe a existência de um dos seres vivos
chamado de humano.
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