50 anos do Vaticano II
A Igreja que renasce no concílio
Por Marcos Cassiano Dutra
Introdução
Entre os anos de 1962 a 1965 acontece o
Concílio Ecumênico Vaticano II, grande evento eclesial da Igreja no Século XX,
o qual comemoramos 50 anos de sua solene abertura. Dezesseis documentos formam
o corpo teórico-doutrinal do Vaticano II, dentre eles um merece especial
destaque, é a Constituição Dogmática Lumen Gentium, que tratou de um dos temas
centrais da reunião conciliar, a Igreja, a eclesiologia, ou seja, o que vem a
ser a Igreja, qual seu papel apostólico, missionário e catequético.
Até então vigorava a tese teológica
da “societas perfecta”, fruto da mentalidade advinda dos concílios de Trento e
Vaticano I, que concebiam a Igreja como uma sociedade perfeita sem ruga, nem
mancha, o reino de Deus institucionalizado que se resumia na hierarquia (papa,
bispos, padres). A eclesiologia de comunhão que o Vaticano II assume e difundi,
rompe com tal premissa da sociedade perfeita ao chamar a Igreja de santa e
pecadora, sempre necessitada e no caminho da conversão. Igreja que não é o
reino, porém está a serviço do reino no mundo e por isso mesmo é sacramento de
salvação aos homens e mulheres na história.
A constituição dogmática conciliar
A Lumen Gentium aponta e recupera o caráter trinitário e comunitário da
Igreja “querida pelo Pai, fundada pelo Filho e santificada no Espírito Santo”.
Uma Igreja que é sacramental e ao mesmo tempo ministerial, uma Igreja que é
hierarquia de dons e carismas e acima de tudo é um mistério sagrado tornado
realidade ao se fazer rebanho do Senhor, povo de Deus, já prefigurado no Antigo
Testamento em Israel e cristificado no Novo Testamento em Jesus, o qual a funda
e firma na rocha da fé de Pedro, escolhido para ser aquele que confirma os
irmãos na fé e os Apóstolos, seus Sagrados Pastores no múnus de reger, ensinar
e santificar a Grei do Senhor em comunhão com o Sumo Pontífice. Igreja que é
uma irmandade de vocacionados que pelo Batismo possuem a mesma dignidade e
cidadania eclesial – são cristãos.
O bondoso Papa João XXIII (que
intuiu e convocou o concílio) assim afirmava – “A Igreja Católica não é um
museu de arqueologia. Ela é como a antiga fonte do vilarejo que dá água ás
gerações, como a deu áquelas do passado”. Essa frase do beatíssimo papa ressoou
de maneira providencial nas discussões que levaram adiante os projetos da Lumen
Gentium; afinal o Vaticano II é profundamente marcado pela personalidade do
Papa João. A pergunta crucial que ajudou a desenvolver a teologia eclesial
desta Constituição Dogmática foi – Igreja, o que dizes de ti mesma?
Sem dúvida, mais que a liturgia, a eclesiologia do Vaticano II, é a
grande responsável pela fisionomia eclesiástica que o providencial concílio
assumiu depois de seu encerramento. O rosto da Igreja transfigurou-se, não a
partir de elementos exteriores como os costumes terrenos e sim a partir da
essência misteriosa e espiritual que envolve a existência da Igreja, que é
Cristo. Em Cristo tudo é novo, e, a Igreja nele é sempre nova e atual, pois o
Evangelho não se altera se pereniza na história como proposta de uma vida e um
mundo diferente em Deus.
Assim é a Igreja, “caminha pelo mundo em perene juventude,
embora antiga desde a época dos Apóstolos” – realça João XXIII em sua primeira Encíclica
“Ad Petri Cathedram”. Assim se concretiza a utopia do “aggiornamento”, da
atualização. Entendendo que a tradição é uma fonte que se renova e o depósito
da fé como um tesouro de vida do qual brota, de maneira sacramental, o sagrado
e não como um baú empoeirado e cheio de quinquilharias, anátemas e excomunhões.
Pensar a Igreja hoje com a Lumen Gentium
Dom Aloísio, Cardeal Lorscheider (In Memorian) conclui dizendo – “O
Vaticano II não veio para definir e condenar, mas para servir e amar”. O
remédio da salvação não é a severidade, e sim a pastoralidade. Vaticano II,
primeiro concílio pastoral da história da Igreja, nos apresenta uma face
belíssima da Igreja de Cristo ao compreender que a catolicidade não é tão
somente cristandade é a comunhão da Igreja consigo mesma e com o mundo, em sua
relação apostólico-social com a família humana universal.
A Igreja renasce com o Concílio
Vaticano II, que propôs um revisitar o núcleo eclesial de onde emana a
tradição, isto é, a transmissão da fé, que são as primeiras comunidades cristãs
na época dos Apóstolos e posteriormente na época da Patrística. Hoje, cinqüenta
anos depois, como redefinir a identidade da Igreja a partir Lumen Gentium? Qual
modelo de Igreja está em vigor? Onde se avançou? Em que se retrocedeu? E qual a
perspectiva eclesial para o futuro? - são essas as cinco perguntas
eclesiológicas pertinentes na celebração do Ano da Fé em ação de graças pelo
Concílio Vaticano II.
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