segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

A criação do mundo e o ser humano

Uma análise da teologia da criação
Por Marcos Cassiano Dutra


A teologia da criação apresenta o mundo como um lugar outrora caos, mas posteriormente organizado por uma ação criativa que formou em sua própria intencionalidade e verbalização (palavra) tudo o que nele contém. A linguagem poética do primeiro livro da Sagrada Escritura (Gênesis), cuja centralidade textual é dizer: Deus criou céus e terra, faz uma inteligente explicação do ato da criação, ao narrar paulatinamente o seu desenvolvimento, sendo o ser humano a criatura mais importante de seu desfecho, pois é imagem e semelhança daquele que o formou apartir de elementos naturais e sobrenaturais, portanto sua substância é natural e sobrenatural, dado que seu ânimo interior (alma) é o ruah divino soprado nele. Como ser revestido de natureza e dignidade divina, passa a ser o guardião da obra criada (paraíso) e, com o passar do tempo, vai descobrindo-se um co-criador, isto é, continuador da criação, não como um deus, e sim como ser humano, por meio do uso da capacidade intelectual que o faz aprimorar suas habilidades no uso do fogo, da pedra e tempos depois, no uso das máquinas e da tecnologia.

 A intelectualidade é um aspecto da criação presente na existência humana, é um dom, um reflexo pensante do ser imagem e semelhança do Criador, cuja finalidade é ajudá-lo a intervir assertivamente na biosfera, para construir sua antroposfera, na qual possa ele viver bem. Esse “ele” é a própria humanidade, simbolicamente representada nas figuras de Adão e Eva na narrativa bíblica.
           
Os efeitos nocivos da ação do homem no meio ambiente caracterizam um ato contraditório diante de sua responsabilidade como zelador da obra criada. Ao invés de co-criador, mostra-se um descriador que, em nome do capital financeiro, brinca de descriar a criação. A mesma auto-suficiência que levou Adão e Eva a perderem a amizade vital com o Criador, hoje continua presente de maneira sofisticada, ideológica e tentadora na ganância do homem, tornando-o, como diria o filósofo Thomas Hobbes, o lobo de si próprio, o caçador de si mesmo. A canonização da doutrina econômica capitalista, produz na humanidade seus efeitos mais desumanos, imorais e descriativos, como o empobrecimento, a fome, doenças, conflitos bélicos e políticos, a corrupção e por fim a degradação da natureza.
           
A humanidade contemporânea ainda não se descobriu guardiã do tesouro da criação, isso acontece devido ao relativismo militante, desta forma a evolução humana fica comprometida, porque se anula e ignora um elemento importante do evoluir humano: a capacidade de saber viver de maneira sustentável. As mobilizações sociais promovidas por ONGs em defesa do meio ambiente, de certa forma prejudicam o descobrir-se humano para a criação, porque são mais iniciativas tendenciosas e sensacionalistas, revestidas de caráter apocalíptico para disseminar o medo e a humanofobia, do que realmente o humanismo e o compromisso com a ecologia.
           
A teologia da criação, longe de ser um anúncio “profético” do fim de tudo, reapresenta a gênese (origem) da vida como palavra-chave para o homem hodierno se auto-conhecer como sujeito e protagonista da obra criada, zelando por ela. Mostrar o homem como mero vilão de tudo é reduzi-lo e desumanizá-lo. Jamais o Deus Criador formou o ser humano para ser destruidor e paralelo à criação. O homem é agente construtor do Criador e parte da criação. Sua humanidade consiste e concretizá-se na medida em que ele relaciona-se com a obra criada em equilíbrio e sabedoria promovendo uma economia solidária.

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